“Até 2050, a produção de alimentos precisa crescer 60%”

“Até 2050, a produção de alimentos precisa crescer 60%”

Agricultura e alimentação

“Até 2050, a produção de alimentos precisa crescer 60%”

Em evento no Colégio Teutônia, palestrantes abordam alimentos saudáveis e sustentabilidade

 

“Da produção ao consumo: alimentos saudáveis do campo para a mesa” e “Agrotóxicos e segurança alimentar: um tema para as gerações presentes e futuras” pautaram palestras em atividade preparatória da 3ª Conferência Internacional de Agricultura e Alimentação em uma Sociedade Urbanizada (AgUrb), que ocorre na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, de 17 a 21 de setembro.

O evento ocorreu no dia 26 de junho, no Auditório Central do Colégio Teutônia, numa parceria entre o CT, a Emater/RS-Ascar, a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), a Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag/RS), a UFRGS, a Articulação de Agroecologia do Vale do Taquari (AAVT) e a comissão organizadora da AgUrb, entre outras entidades. Os palestrantes foram a Mestre e Doutora em Desenvolvimento Rural, Potira Preiss, coordenadora executiva da AgUrb; e o advogado, Mestre em Direito Público, Renato Barcelos, integrante do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos.

Eventos preparatórios para a Conferência estão ocorrendo em todo o Brasil. A 3ª AgUrb prevê ampla programação na capital gaúcha, incluindo painéis de escopo internacional, simpósios, apresentação de trabalhos científicos em grupos de trabalho temáticos, relatos de experiências, saídas de campo e atividades culturais.

“O desafio alimentar do Século XXI consiste em nutrir, de forma adequada e saudável, ambientalmente sustentável, uma população que deverá chegar aos 9,5 bilhões de habitantes em 2050. A solução não passa apenas por aumentar a produção e a oferta de alimentos, mas na construção de novos métodos de cultivo e formatos tecnológicos de base ecológica, mudanças no preparo e transporte que evitem desperdícios e melhorem o aproveitamento integral dos alimentos”, frisou a bióloga e professora do Colégio Teutônia, Mirian Fabiane Strate, mestranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS) e integrante da equipe executiva da AgUrb, que mediou o debate no CT.

 

Desafios

 

“A maioria inquestionável da população continuará nas cidades e nos espaços urbanos no Século XXI. Nas projeções para 2050, a produção de alimentos precisa crescer 60%. O incremento nos rendimentos agrícolas de arroz, trigo, soja e milho serão insuficientes e o consumo de carnes deverá subir. Quanto maior a necessidade de produção de alimentos, maior será o consumo de água e de energia”, apresentou Potira.

Nesse contexto, ela reforçou a importância da produção local de alimentos. “A greve dos caminhoneiros é um exemplo de como o nosso sistema alimentar é vulnerável, com alimentos que não chegavam à população. O processo de industrialização da alimentação está mais preocupado com a quantidade do que com a qualidade. E como vamos alimentar o mundo, com que tipo de alimento?”, questionou.

Como consequência da cultura exploratória na produção de alimentos, Potira falou da crescente dependência dos agrotóxicos na agricultura, da erosão e contaminação do solo e do desperdício. Apresentando mapa climático, mostrou-se preocupada com o cenário para o território brasileiro. “O Brasil está cada vez mais propenso ao desequilíbrio ambiental. Como a agricultura depende do clima, essa tendência é algo devastador”, elucidou.

No que se refere ao desperdício, apresentou diversos números e estatísticas, com destaque para o fato de que 1/3 da comida produzida no mundo é desperdiçada. “Hoje, 1,3 bilhão de toneladas de alimentos é jogado fora. Se continuarmos nesse ritmo, até 2050 faltará comida para alimentar o mundo todo. Podemos afirmar que não é preciso mais alimentos, mas sim com maior qualidade e melhor distribuição”, enumerou Potira.

Outro foco da palestra considerou o sistema de abastecimento. Segundo a palestrante, no Brasil, a grande maioria da população (80%) busca o seu alimento nos supermercados, em detrimento às feiras livres (8%) e outras alternativas. Diante desse cenário, reafirmou a importância da valorização de origem territorial e cultural, citando, inclusive, a importância das hortas escolares. “As crianças aprendem a se alimentar com os adultos”, concluiu.

 

Legislação e agrotóxicos

 

Barcelos falou do distanciamento cada vez maior do homem da natureza. “O ser humano vive uma crise de vínculo com a natureza, não percebe o quanto ela é importante para todos nós. Do ponto de vista legal e constitucional, temos o direito ao Meio Ambiente saudável e equilibrado. Além disso, há diversos modelos de agricultura em disputa, e como fator agravante, o uso de agrotóxicos influencia diretamente na segurança alimentar e nutricional”, alertou.

Como advogado, com atuação junto a entidades sindicais rurais, e formado técnico agrícola, Barcelos foi consistente ao destacar a importância do trabalho dos pequenos agricultores. “Mais de 70% dos alimentos na mesa dos brasileiros vêm da agricultura familiar, por isso o setor e esses trabalhadores precisam ser mais protegidos, e não ser os mais sacrificados como ocorre hoje. Paralelamente a isso, há a agricultura das grandes extensões de terra e do grande uso da tecnologia, com valorização do agronegócio, da mercadoria e das commodities”, exemplificou.

O palestrante também se disse muito preocupado com o uso de agrotóxicos. “Sabe-se que são elementos químicos que alteram a organização natural dos cultivos. É um cenário mundial, um mercado bilionário para as empresas do ramo. O Brasil é o maior consumidor de veneno no mundo, o equivalente a 20% de todo agrotóxico utilizado no planeta. Em 2014, foram 500 milhões de quilos, dos quais o cultivo da soja representa 52%. Precisamos ter barreiras para essa prática, mas a lei vem flexibilizar com pacote de medidas”, preocupou-se.

Por fim, Barcelos estimulou a reflexão: “o planeta enfrenta um limite ecológico, e isso tem relação direta com a segurança alimentar”.

 

3ª AgUrb

 

A Conferência Internacional de Agricultura e Alimentação em uma Sociedade Urbanizada sinaliza esforço de uma comunidade internacional de pesquisadores acadêmicos, organizações da sociedade civil e formuladores de políticas, no sentido de debater as mudanças climáticas e suas repercussões sobre a água e a biodiversidade, a busca por fontes alternativas de energia e as transformações demográficas.

A Conferência busca reunir múltiplos atores envolvidos com a temática agroalimentar para refletir e debater sobre novas estratégias de produção, distribuição e consumo de alimentos em sociedades cada vez mais urbanizadas.

Antes da edição agendada para Porto Alegre, o evento foi realizado em 2012, na Holanda, e em 2015, em Roma. O tema central deste ano será “Alimentos saudáveis, sociobiodiversidade e sistemas agroalimentares sustentáveis: inovações do consumo à produção”, privilegiando a apresentação, o aprimoramento e a difusão de conceitos, artefatos, práticas e processos relacionados a sistemas agroalimentares sustentáveis e resilientes.

A AgUrb deve reunir público bastante diversificado, formado por diferentes campos do conhecimento e múltiplos atores, entre professores, pesquisadores, estudantes, técnicos, profissionais, agentes de governo, servidores públicos, ativistas de movimentos sociais, representantes de organismos políticos de representação nacional e internacional, empresas, agricultores e consumidores. Mais informações podem ser consultadas no site agricultureinanurbanizingsociety-com.umbler.net/

 

 

TEXTO – Leandro Augusto Hamester

 CRÉDITO DAS FOTOS – Leandro Augusto Hamester